quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Uma fórmula para um Brasil sem miséria

Publicado no Blog do Zé em 19/12/11.
ImageLeopoldo Vieira

(artigo na revista do Instituto Juventude)

Mapa feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) com base em dados preliminares do Censo Demográfico de 2010 reforça que não é possível o plano de erradicação da miséria, proposto pelo governo federal, sem recorte juvenil, pois o levantamento é taxativo quanto ao perfil majoritário dos miseráveis brasileiros: é jovem, negro e nordestino. Os extremamente pobres são 8,5 % da população do país, 70,7% não têm rendimento nenhum e 50,9% têm, no máximo, 19 anos de idade. Desses, 46,7% dos extremamente pobres vivem no campo, 15% da população brasileira (exceto na Amazônia, onde marca 26%).

Análise dos dados revela também que essa parcela da população não tem acesso à serviços públicos, como água encanada, coleta de esgoto e energia elétrica.

O perfil está traçado: é a nata dos jovens fora da escola ou só trabalhando, foco de analfabetismo, alvos privilegiados do crack e outras drogas, pleno de defasagem escolar, empregado indecentemente, desempregado ou no crime, com dificuldades inclusive de acessar o básico da esteira de oportunidades abertas pelo governo, inclusive o Pronatec.
Não é o caso de inventar a roda, mas de ajustar o que tem que ser ajustado e ampliar consideravelmente a escala do Projovem, incluindo-o neste plano anti-miséria com muito destaque. Isso, inclusive, está sendo previsto com a ida do programa para o MEC.

Por outro lado e complementar a esses dados, é interessante e instigante a pesquisa "Trabalho, Educação e Juventude na Construção Civil", da Fundação Getúlio Vargas (FGV), além de muito oportuna, pois debate as dificuldades da construção civil (63% dos investimentos totais na economia)para atrair profissionais às vésperas do aumento da demanda por caisa da Copa do Mundo, das Olimpíadas, da continuidade do PAC e do programa "Minha Casa, Minha Vida". Aqui se situa um dos gargalos do dito "apagão de mão de obra" que o país atravessa, uma vez que o porcentual de trabalhadores na construção civil na faixa etária de 15 a 29 anos caiu de 36,49% em 1996 para 29,24% em 2009.

Segundo o estudo, "o aumento do nível de escolaridade tem afastado os jovens brasileiros do trabalho na construção civil", pois "eles agora preferem ocupações menos braçais e mais qualificadas". O que é meia verdade, já que, afora o "trabalho braçal", é pesada a brutalidade das condiões de trabalho. Por isso, ajuda e é uma excelente iniciativa do governo federal, que mudará de uma vez por todas as de relações trabalhistas semi-feudais na construção de civil, a elaboração do marco regulatório para o setor, anunciado pelo Ministério do Trabalho.

Isso dará fôlego para as obras que precisarão ser feitas de qualquer maneira e incluirá mais jovens no setor, gerando oportunidade e renda para as classes mais empobrecidas, já que em 1996, 51,28% das famílias dos profissionais dedicados à construção civil estavam nas classes D ou E, mas em 2009, apenas 36,2% representavam as classes D ou E e ambas as camadas, quanto a próppria C tem a maioria de sua composição formada por jovens.

Entretanto, cruzando estes dados e a assertiva "o aumento do nível de escolaridade tem afastado os jovens brasileiros do trabalho na construção civil" com os números que dizem somente 17,8% dos trabalhadores ocupados na construção civil freqüentaram curso de educação profissional, observa-se um movimento de marginalização dos jovens trabalhadores vindos das classes D e E (as camadas mais empobrecidas), já que a mobilidade existente nestes canteiros de obras se deve à valorização destes (insuficiente para segurar a juventude), em virtude da demanda e um movimento de fuga dos jovens mais próximos dos "pontos de corte" do mercado para melhores salários e empregos. Além do que, a força de trabalho que permanece nos canteiros não tem qualificação formal para o trabalho e há uma predominância dos operários ligados à classe C, talvez exatamente pelos "pontos de corte". Então cabe a pergunta: este movimento migratório dos jovens é generalizado na faixa etária ou restrito aos que conseguem progredir na escolaridade, deixando a massa que vive o dilema da distorção idade/série, que só trabalha, que não completou sequer o ensino fundamental, que não estuda e nem trabalha, analfabetos, de fora?

O diagnóstico do estudo é que "o jovem não está querendo trabalhar na construção civil.Logo, o setor vai ter de lhe pagar mais, qualificá-lo e atraí-lo com mais direitos trabalhistas". E propõe-se a seguinte saída: "o desenvolvimento de tecnologias que reduzam a necessidade do trabalho braçal e o aumento dos salários determinado pela demanda do mercado".
Quantos às soluções, concordo com as duas e acredito que devam surgir, via juventudes sindicais, via esferas como SNJ e Conjuve, pensadores e outros atores, neste marco regulatório do MTE, na dinâmica do pacto tripartite entre governo-empreiteiras-centrais sindicais para resolver o problemas das péssimas e degradantes condições de trabalho na área ou num "pacto pela juventude" que coloque no centro a questão da educação e trabalho, independentemente de classe econômica e escolaridade dessa juventude.

Entretanto, quanto às soluções, tenho mais acordo com Rafael Gioielli, gerente de Pesquisa e Desenvolvimento do Instituto Votorantim, que apoiou o estudo da FGV:"uma solução é investir em trabalhadores com menos escolaridade e capacitá-los para que possam entrar no mercado da construção". Isso dialoga com uma terceira solução da FGV: "os cursos de qualificação - pode ser uma solução rápida, necessária para o País se preparar para a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016".

Segundo ele, "o governo tem visto a construção civil como uma possibilidade de primeiro emprego para uma série de pessoas que estão fora do mercado de trabalho", nossos 11% em geral e, com atualização de dados, cerca de 14% de jovens (antes era de 7% para 10%), naquele contexto justamente de desemprego descontínuo: 78% ja trabalharam e esperam oportunidades de contratos ou melhores pagamentos, tendo, todavia, 22% que não.
Na verdade, acredito que precisamos e temos uma grande oportunidade, no contexto da meta de erradicar a miséria no Brasil, sabendo que a maioria dos jovens estão nas classes C, D e E e que estas são a maioria da população, de investir nessa juventude da mais baixa renda e escolaridade.

Novamente, o Projovem segue sendo - dentro das novas possibilidades abertas com sua transição institucional - o link com a força de trabalho da construção civil no país, sem abrir mão do processo escolarizante e do foco nas faixas de renda. Erradicação da miséria, juventude e grandes eventos esportivos são uma fórmula central para superar essa condição social, sempre dentro da fundamental agenda de Trabalho Decente: a grande virada na qualidade da geração de empregos que os jovens brasileiros demandas para serem o elo entre o Brasil subdesenvolvido e o Brasil do "primeiro time".

Leopoldo Vieira é consultor em legislação e políticas públicas de juventude, editor do blog Juventude em Pauta!.

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